Doce flautista

No aparente ,  
nada se enxergava. 
No inaparente, 
a visão se completava

Não enxerga tu 
minhas tristezas 
feito tecido cru?
Não enxerga tu
minha beleza?

O olhar é turvo.
E tu esbarraras em mim, 
meu coração é só murmúrio. 
Pois nada enxergas enfim. 

Meu barco ficou sem norte
e a solidão agora ronda.
Tu vês que desejo a morte?
Mesmo que tu me sondas? 

Perdeu-se naquela tarde.
Todo encanto, todo pranto, 
todo desejo, toda maldade, 
toda volúpia, todo encanto. 

Não vislumbro horizonte.
Na há lei da atração. 
Apenas desejo insolvente. 
Desses que ferem o coração. 

Vai barco traiçoeiro! 
Vai enfim desgovernado, 
para o grande desfiladeiro. 
O coração enlutado

Todo arrebentado. 
Todo estraçalhado. 
Todo encarcerado. 
Todo machucado. 

Envia socorro ó Deus, 
a esta humilde pessoa, 
que cansada, emudeceu. 
Emudecida segue sozinha 
para os braços de morfeu...
Por Zizi 

Carta do Adeus

Naquela tarde bucólica
...eu chorei! 
Senti todas misérias
do mundo em meu ser. 
O café esfriando na xícara, esfriava meu coração. 
O bolo feito no esmero definhava à espera de uma companhia e compaixão. 
O horizonte agora cinza, cegava sua visão. 
Ao longe os “pios” da tarde eram música para sua solitária percepção. 
O café esfriava e com ele, a sensação de vida. 
A fraca luz do ambiente já não aquecia sua alma. 
Ao longe avistou da janela 
uma luz  em sua direção! 
Uma luz fluorescente adentrou o ambiente
e seus pensamentos,
se tornaram dormentes.
Seu corpo ficara gélido. 
Sentiu as pálpebras pesadas. 
O coração trêmulo
em pulsações intermitentes, 
anunciava sua partida
deste mundo algoz.
Que sufocou de vez sua voz...
Por Zizi

Lamento

A tênue linha imaginária 
que lindamente os separavam
na verdade era o fio 
que os entrelaçavam
Viver ou morrer 
sem o conhecer
Era um sentimento
que doía por dentro.
Na confusão das almas
ela encontrava paz 
ao lado de fugaz rapaz
Tormenta de noites escuras
por um amor que lento jazia
em seu fraco coração.
E o amor e suas juras?
Sem luz sua alma esvazia
e o viver só lamúrias.
Seu jardim desertificado,
planta nenhuma florescia
Por que viver assim, Deus?
Retira a dor e o planto, 
anjos, deem acalanto. 
Não olhe a dor na alma,
apenas a beleza da tristeza 
não chore, se acalme. 
Deixe o destino virar a mesa...
Por Zizi Palloni Somense 







Sua cidade tem:  uma linda praça, um belo coreto e um chafariz iluminado. 
Como a praça é um espaço público, coletivo. Pertence à todos, que querem desfrutar desse espaço, sendo rico ou pobre. A praça é memória coletiva e dá identidade aos cidadãos. 
Aí chega um cidadão de bem e diz que o progresso precisa chegar, que precisa melhorar o nível dos frequentadores. Derruba árvores centenárias, o belo coreto de 1880, bancos confortáveis e o belo chafariz. O que sobra?
Cimento armado, bancos modernos, poucas árvores para “despoluir” o ambiente e os frequentadores continuam os mesmos, pois a praça é um ambiente de passeio e descontração, às vezes, o único quintal de alguém! Mas aí que reside a ignorância social dos que reformulam este espaço em nome do progresso, os poderosos eliminam tudo o que é do povo, que tem memória, que dá identidade! Não pensem que não é proposital, essa ideia de que venha o novo, camufla na verdade, uma ânsia de poder. Vamos eliminar aquilo que produziu uma memória coletiva a fim de criar uma nova onde somos os atores principais! É o nome do sujeito que fica eternizado no projeto de remodelação. As cidades interioranas ainda mantém suas praças à moda antiga! Já os grandes centros eliminaram esses espaços em nome do progresso, da modernidade! 
Quase não há hoje - com exceção dos shoppings -lugares para o flerte, nas décadas de 40/50, os jardins das cidades eram esses espaços! Minha mãe conheceu papai num “footing”, palavra inglesa que significa no Brasil, “(...)um passeio de ida e volta, em trecho curto, de rapazes e garotas para verem o sexo oposto ou iniciarem um namoro -, o corpus apresenta vários exemplos como este: “Ponto de encontro [os shopping centers] (como os antigos footings do interior) de paquera, de exibição, compra…” (Ignácio de Loyola Brandão, Leia, 1989). > 5, 6.1, 6.3, 7 e 12. Tempos sadios de olhares cruzados, mão na mão, beijos doces. A praça e seus bancos aconchegantes sempre foram espaços de identidade, é um elemento cultural importante na formação histórica dos moradores, ao invés de demoli-la, o certo é preserva-la e a história que ela registra. 

Conto do esquecimento

Estava ela em um grande salão, com lindos pilares em estilo rococó, pintados à ouro. Vestida lindamente em seda javanesa com pequenos brocados. Os cabelos eram sustentados por uma linda tiara de diamantes. Ela não tinha certeza de quem era, talvez uma dama, uma princesa, uma rainha? 
No centro de uma enorme sala adjacente ao grande salão, um homem ostentando um grande charuto, ria largamente com os demais senhores. Ele a observou ao longe, assim como ela também o observou. Seus olhares se cruzaram por uns instantes. Não o conhecia. 
O mestre de cerimônia anuncia uma valsa a fim de que os dançantes se organizassem. E sem par, ela sentou à mesa, bebendo uma taça de champanhe. Distraída na formação dos pares, não notou que galantemente o jovem da sala de charutos a tirava para dançar. Não saberia dançar sem pisar-lhe os pés e recusou o convite. Porém, o nobre senhor insistiu e ela resolveu aceitar timidamente. Com leveza e atenção ele a conduziu e ela sentiu-se voar em seus braços! Seu hálito almiscarado a estonteou e por instantes sua visão escureceu. Acordou nos braços daquele homem, que massageava suas mãos, assustado. Um médico no local sugeriu um passeio ao ar livre para aliviar a pressão. O cavalheiro conduziu-a aos jardins perfumados de damas da noite...a brisa leve, as mãos firmes em sua cintura daquele desconhecido, a acalmou completamente. Ela o conhecia de outra vida, pois seus olhos enxergavam além do aparente. Ela o amou desde o primeiro olhar. E acredito que o mesmo aconteceu com ele. 
Não houve apresentações formais e ali naquele jardim, ele tomou-lhe num beijo doce e terno. Ela sabia que encontrou sua alma gêmea. Estar ao lado dele era o que sua alma mais ansiava. Não conseguiram mais se separarem. A paixão foi imediata e no dia seguinte se casaram numa igrejinha, tendo Deus como testemunha.  Nunca mais se separaram. Mas ela tinha uma doença desconhecida - não tinha memória recente - e todo dia este homem com ela se casava para que ela nunca o esquecesse e soubesse que ele era seu consorte e que me amaria eternamente. 
Por Zizi Palloni Somense